sexta-feira, 21 de março de 2014

Saudade do interior


Ando com interesses tão diferentes, escrevendo coisas tão distintas, que sobrou pouco espaço para a cidade, mas hoje eu queria contar que encontramos um dos vizinhos de prédio no cachorro-quente da Boulevard Norte (já recomendado por aqui, aliás). Ele estava com o filho, um loirinho de uns 4 anos.


Eles se sentaram ao lado e conversamos, naqueles poucos minutos entre um cachorro-quente e uma coca-cola, muito mais do que em um ano de bons-dias e como-vais no elevador.


Acho que foi o Dia Internacional dos Vizinhos, pelo menos lá no meu prédio, pois, quando chegamos, encontramos no elavador outra vizinha, a da porta da frente, e entabulamos  uma conversa pachorrenta sobre a vida, sobre o lindo enfeite que ela tem na porta (e eu quero um igual!), sobre a paixão que a Letícia tem pelo tal enfeite, sobre a opinião dela de que a menininha já não é tão pequena assim etc.


Foi um dia bem diferente dos dias normais, em que nosso contato com a vizinhança praticamente beira o zerovírgulazero, nesse miserável estilo de vida de não-se-meta-na-minha-vida-que-eu-não-me-meto-na-sua. É inevitável, então, diante do prazer que sentimos em trocar um dedo de prosa, pensar em quantas amizades perdemos, por não ter tempo para uma conversa. Quanto deixamos de viver, engaiolados nos nossos nichos, nestes caixotes de concreto?


Talvez essas perdas e essa superficialidade sejam necessárias. Na verdade, são necessárias sim, se a gente considerar a realidade dos espaços diminutos e das paredes devassáveis. Eu mesma sei que um outro casal (nenhum dos citados) faz sexo umas 3 vezes por semana, que a mulher geme baixinho (ahn,ahn,ahn...). São de uma regularidade incrível, e eu ouço isso enquanto dou mamadeira para a filha. Sei também que o filho da vizinha (essa da porta enfeitada) sai todo o dia regularmente às 6 e 15 da manhã, leva o lixo e depois volta pra fechar a porta e pegar o elevador. Sei mais um monte de coisas, porque é tudo muito estreito e a gente vive muito junto, de tal modo que é preciso resguardar um mínimo de privacidade, nem que seja essa assim do você-me-ouve-transar-mas-eu-não-te-cumprimento-direito-e-não-pense-que-somos-íntimos.


Enfim, mas que é uma vidinha miserável, ah, isso é sim.